• "A louca do castelo."





    BALADA DO SER ESTRANHO




    Como um infante que ainda não sabe ler
    Tento, em vão, decifrar as estrias
    Que mapeiam tua escuridão

    Mas não vejo nada!
    Não vejo nada, além do teu próprio umbigo

    Tu não pertences nem a ti
    Quiçá a um destino, uma estrada

    Tu te tornaste um homem estranho
    Metade bicho, metade estanho
    Tu não pertences a tempo algum,
    A nada
    Nem ninguém
    E nada te pertence
    Além dessa voz de gesso

    Nesse rosto de estátua

    Quando tu abres a boca
    Não é o vento da alma que bole tuas palavras
    Mas a fanfarra dos mortos que carregas nas costas
    E sempre falam por ti

    A única coisa que te pertence
    São tuas faltas ancestrais

    Minhas tentativas e esforços
    Para decifrar-te antes que devores a ti mesmo
    São insanas e vãs
    Porque sempre que os nossos ecos se encontram
    Eles deixam um rastro nas coisas oscilantes
    E transformam ações em ritos
    Acontecimentos em cerimônia
    Anseios em mitos
    Poemas em vergonha

    Um dia
    Quem sabe um dia
    As palavras hão de adormecer
    No céu da nossa boca
    E nesse dia
    A única vergonha que sentiremos
    Será a vergonha da nudez castigada pela roupa



    VISITA INESPERADA


    Freqüento meus medos de tempos em tempos. Peço licença, me benzo e abro a porta. Sinto o cheiro, a textura. Escuto seus sons. Ruídos me assaltam! São as batidas do meu coração.

    Quanto mais perto, mais deserto. Fracassos, tabaco, paixões platônicas, traições, inveja, mentiras, infinitos nãos. Eles não têm forma, apenas existem como sementes esquecidas em terrenos áridos.

    Meus medos ardem feito pimenta malagueta quando escorre por descuido pelas narinas. Eles me petrificam. Me fazem culpada de atos que sequer cometi, mas nem por isso me fazem comedida - sempre estou mais exposta do que gostaria e quando os visito certa de que eles evaporaram descubro outros tantos distantes das minhas pupilas.

    Uns são feitos de calor, lágrima e saliva, outros sobrevoam meus dias como gigantescas águias, prestes a me depredarem.

    Apenas uma porta nos separa. Não sei se ela é grande, se é pequena. Não sei se é de madeira ou espelho. Se é de pano, grades de ferro ou porcelana. Sei, apenas, que está fechada e que minha face corada sempre denuncia o que há por trás do anseio de não cometer enganos.

    Me afligem as coisas que não entendo e por não entende-las não controlo. Não controlo os ventos nem as marés, mas sei exatamente como funcionam – eis o maior advento da ciência: dar segurança ao homem. Mas não sei como funcionam forças sobrenaturais como o amor e temo me perder e para sempre ficar abandonada num cais imaginário.

    Talvez o meu maior medo seja não saber amar. E o que mais me causa dor é saber que não adianta sabê-lo.

    Estou tentando apagar o rastro das minhas mentiras mas às vezes desconfio que elas são as únicas verdades que possuo, que são as únicas pistas que tenho sobre mim mesma e que somente minhas mentiras me dão a noção exata de que sou feita de sal.

    Meus medos desistiram de esperar minhas visitas e durante as noites suspiram em meus ouvidos melodias que não compreendo. Os meus medos me arrepiam, mas me fazem sentir que estou viva.



    CÉU

    Enfeitei meu corpo de céu
    E o sol se pôs em meu umbigo
    Pintas viraram estrelas
    Cabelo, fios de horizonte
    Saliva, chuva
    Peitos, lua
    Enfeitei meu corpo de céu
    Para fugir dos meus perigos
    E o diabo atento aos detalhes
    Tomou meu corpo como seu abrigo



    SER OU NÃO SER DE NINGUÉM, EIS A QUESTÃO DA GERAÇÃO TRIBALISTA


    Na hora de cantar nas boates todo mundo enche o peito, levanta os braços, sorri e dispara: “eu sou de ninguém, eu sou de todo mundo e todo mundo é meu também”. No entanto, passado o efeito do uísque com energético e dos beijos descompromissados, os adeptos da geração “tribalista” se dirigem aos consultórios terapêuticos, ou alugam os ouvidos do amigo mais próximo para reclamar de solidão, ausência de interesse das pessoas, descaso e rejeição. A maioria não quer ser de ninguém, mas quer que alguém seja seu.

    Beijar na boca é bom? Claro que é! Manter-se sem compromisso, viver rodeado de amigos em baladas animadíssimas é legal? Evidente que sim. Mas por que reclamam depois? Será que os grupos tribalistas se esqueceram da velha lição ensinada no colégio de que “toda ação tem uma reação”? Agir como tribalista tem conseqüências, boas e ruins, como tudo na vida. Não dá, infelizmente, para ficar somente com a cereja do bolo - beijar de língua, namorar e não ser de ninguém. Para comer a cereja é preciso comer o bolo todo e nele, os ingredientes vão além do descompromisso, como: não receber o famoso telefonema no dia seguinte, não saber se está namorando mesmo depois de sair um mês com a mesma pessoa, não se importar se o outro estiver beijando outra, etc, etc, etc.

    Embora já saibam namorar, “os tribalistas” não namoram. Ficar também é coisa do passado. A palavra de ordem hoje é “namorix”. A pessoa pode ter um, dois e até três namorix ao mesmo tempo. Dificilmente está apaixonada por seus namorix, mas gosta da companhia do outro e de cultivar a ilusão de que não está sozinho. Nessa nova modalidade de relacionamento, ninguém pode se queixar de nada. Caso uma das partes se ausente durante uma semana, a outra deve fingir que nada aconteceu - afinal, não estão namorando. Aliás, quando foi que se estabeleceu que namoro é sinônimo de cobrança?

    A nova geração prega liberdade, mas acaba tendo visões unilaterais. Assim como só deseja “a cereja do bolo tribal”, enxerga apenas o lado negativo das relações mais sólidas. Desconhece a delícia de assistir um filme debaixo das cobertas num dia chuvoso comendo pipoca com chocolate quente, o prazer de dormir junto abraçado, roçando os pés sob as cobertas e a troca de cumplicidade, carinho e amor. Namorar é algo que vai muito além das cobranças. É cuidar do outro e ser cuidado por ele, é telefonar só para dizer boa noite, ter uma boa companhia para ir ao cinema de mãos dadas, transar por amor, ter alguém para fazer e receber cafuné, um colo para chorar, uma mão para enxugar lágrimas, enfim, é ter alguém para amar.

    Já dizia o poeta Carlos Drummond de Andrade que “amar se aprende amando” e se seguirmos seu raciocínio esbarraremos na lição que nos foi transmitida nas décadas passadas: relação é sinônimo de desilusão. O número avassalador de divórcios nos últimos tempos só veio confirmar essa tese e aqueles que se divorciaram [pais e mães dos adeptos do tribalismo] vendem, na maioria das vezes, a idéia de que casar é um péssimo negócio e que uma relação sólida é sinônimo de frustrações futuras. Talvez seja por isso que pronunciar a palavra “namoro” traga tanto medo e rejeição. No entanto, vivemos em uma época muito diferente daquela em que nossos pais viveram. Hoje podemos optar com maior liberdade e não somos mais obrigados a “comer sal junto até morrer”. Não se trata de responsabilizar pais e mães, ou atribuir um significado latente aos acontecimentos vividos e assimilados na infância, pois somos responsáveis por nossas escolhas, assim como o que fazemos com as lições que nos chegam. A questão não é causal, mas quem sabe correlacional.

    Podemos aprender a amar se relacionando. Trocando experiências, afetos, conflitos e sensações. Não precisamos amar sob os conceitos que nos foram passados. Somos livres para optar. E ser livre não é beijar na boca e não ser de ninguém. É ter coragem, ser autêntico e se permitir viver um sentimento… É arriscar, pagar para ver e correr atrás da felicidade. É doar e receber, é estar disponível de alma, para que as surpresas da vida possam aparecer. É compartilhar momentos de alegria e buscar tirar proveito até mesmo das coisas ruins.

    Ser de todo mundo, não ser de ninguém é o mesmo que não ter ninguém também… É não ser livre para trocar e crescer… É estar fadado ao fracasso emocional e à tão temida solidão.



    SOBRE FORMIGAS E ELEFANTES



    Minha cabeça gira como um cata-vento esquecido num jardim onde nunca venta. Um jardim onde as laranjeiras não dão fruto, mas estão sempre floridas, espalhando um cheiro branco no ar.

    Tem dias que me pego deitada na terra úmida desse lugar sentindo-me parte dele…. Sentindo-me única, como quem escuta por descuido um desejo de Deus e percebe-se cúmplice de uma verdade indiscutivelmente absoluta. Noutros me ponho apenas a cavar como uma serva obediente que desconhece o linho das possibilidades e não sabe ao certo o que deve colher ou enterrar.

    Nas noites sem lua tento esconder os entulhos do tempo sob a terra, o que é inútil, porque toda e qualquer chuva lava, ara e desmascara o que não for semente de flor nesse jardim onde os cata-ventos são esquecidos.

    Por lá não há anões, nem minhocas, mas há formigas! Formidáveis saúvas que se proliferam como idéias obsessivas e me salvam de saber-me aflita diante da constatação de que não passo eu, também, de uma formiga! Uma formiga que sonha em ser elefante. Ou melhor, uma formiga que sonha como um elefante.

    Minha cabeça gira como um cata-vento esquecido num jardim onde nunca venta. Mas é domingo! É domingo e talvez em algum circo distante um palhaço montado nas costas de um elefante consiga ensinar para uma criança que sorrir quando se quer chorar às vezes é importante e que nem sempre os maiores e mais fortes estão por cima.

    Eu devia ter freqüentado mais o circo.



    FILHO É PARA QUEM PODE



    Filho é para quem pode!

    Eu, não posso! Apesar de ser biologicamente saudável.

    Não posso porque desconheço o poço sem fundo das minhas vontades, porque às vezes sou meio dona da verdade e porque não acredito que um filho há de me resgatar daquilo que não entendo ou aceito em mim.

    Acredito que a convivência é um exercício que nos eleva e nos torna melhores, mas, esperar que um filho reflita a imagem que sonhamos ter é no mínimo crueldade.

    Não há garantias de amor eterno e o olhar de um filho não é um vestido de seda azul ou um terno com corte ideal. Gerar um fruto com o único intuito de ser perfumada por ele no futuro é praticamente assinar uma sentença de sal.

    Filhos não são pílulas contra a monotonia, pílulas da salvação de uma vida vazia e sem sentido, pílula “trago seu marido de volta em 9 meses”.

    Penso que antes de cogitar a hipótese de engravidar, toda mulher deveria se perguntar: eu sou capaz de aceitar que apesar de dar a luz a um ser ele não será um pedaço de mim e portanto não deverá ser igual a mim? Eu sou capaz de me fazer feliz sem que alguém esteja ao meu lado? Eu sou capaz de abrir mão de determinadas coisas em minha vida sem depois cobrar? Eu sou capaz de dizer “não”? Eu quero, mesmo, ter um filho, ou simplesmente aprendi que é para isso que nascemos: para constituir uma família?

    Muitas das pessoas que conheço estão neurotizadas por conta de suas relações com as mães. Em geral, são mães carentes que exigem afeto e demonstração de amor integral para se sentirem bem e, quando não recebem, martirizam os filhos com chantagens, críticas e cobranças.

    As mães podem ser um céu de brigadeiro ou um inferno de sal. Elas podem adoçar a vida dos filhos ou transformar essas vidas numa batalha diária cheia de lágrimas, culpas e opressões.

    Eu, por exemplo, não consigo ser um céu de brigadeiro nem para mim mesma, quiçá para uma pessoinha que vai me tirar o juízo madrugadas adentro e, honestamente, acho injusto colocar uma criança no mundo já com essa missão no lombo: fazer a mamãe crescer.

    Dar a luz a um bebê é fácil, difícil é ser mãe da própria vida e iluminar as próprias escuridões.



    TENHO PENA



    Tenho pena das mulheres que não gozam
    Elas não sabem
    Que sobre o colchão
    A pele derrete
    E que suas grutas ficam quentes
    Como lava de vulcão

    Desconhecem a meninice dos dedos
    Que pulam de um mamilo ao outro
    E brincam de esconde-esconde
    Sob a chuva de estrelas mil

    Não imaginam para que servem as mãos
    Nem para que suas bocas foram feitas - T
    alvez seja por isso que falem demais

    Tenho pena das mulheres que invejam aquelas que gozam
    Elas não sabemQue seus seios são frutas maduras
    Morangos, pêssegos, pêrasPequenas cerejas
    Mergulhadas em doces trufas


    Por suas pernas e ancas
    Jamais escorreu o néctar dos deuses
    A bebida sagrada
    O mel branco que é alimento
    Feito leite de cabra

    Tenho pena dessas mulheres!
    Por que elas serão
    Eternamente

    Amargas



    MEU JARDIM



    Eu daria o mundo
    Por um canto em mim

    Um pedaço de alma qualquer
    Onde eu pudesse plantar a calma
    Enfeitar meus afetos
    E caber dentro do meu coração

    Mas minha terra úmida
    Está sempre tomada por outros grãos

    Sementes de medo
    Casulos de seda
    Sede de ser única

    Vago pelas noites
    Como um vaga-lume pelas manhãs

    No espelho, não me vejo
    Pressinto, apenas, o gosto do gozo
    O delírio de aceitar-me
    E de caber, finalmente
    Neste corpo quente que me aquece




    A GAROTA CERTA


    Você achou que eu era a garota certa. A garota que depois de uma ressaca chegaria calada com aspirinas e coca-cola, pronta para te chupar.

    Você achou que eu fosse a garota certa para assoprar suas feridas sem pedir nada em troca.

    Você achou que eu fosse a garota certa para subjugar em seu jogo imaginário e junto a ti enlouquecer.

    Não, honey, você estava enganado. Eu não estou – nem nunca estive – disposta a curar suas chagas. Nunca fiquei em beira de estrada esperando um estuprador de almas me assaltar e não seria agora que me colocaria nessa encruzilhada.

    Não, baby! Eu não sou esse tipo de garota.

    Sou do tipo que amarra o cabelo no alto da cabeça e ajeita alguns fios displicentemente para fingir naturalidade.
    Que usa óculos gigantes na face para esconder o brilho dos olhos com medo que eles sejam roubados e bolsas enormes para guardar todos os poemas que ainda não escrevi.

    Sou o tipo que gosta de tomar sorvete de flocos depois do sexo. Sou o tipo que diz “eu te amo” quando tem vontade. Sou o tipo que usa sapato de salto mesmo com os pés machucados, que usa calcinha de algodão de meninininha e sutiã de oncinha. Sou o tipo que se vira ao avesso com mais freqüência do que gostaria.

    Eu não sou quem você imagina, honey. Não sou a lótus que nasceu da lama do teu umbigo, não sou tua sombra, nem teu caminho. Não sou o que te falta.

    Minhas insônias não são culpa tua, lamento em informar! Elas são minhas escolhas e, antes de qualquer coisa, parte do meu plano original: estar em estado de alerta para me defender de gente estranha como você; estar em estado de alerta para ouvir o barulho de uma estrela se abrindo no mar ou um poema batendo as asas e levantando a poeira da minha escuridão.

    Eu não sou, darling, definitivamente, a rosa que você teve medo de matar em sua infância quando espetou o dedo na roseira. Não sou a garota certa para você porque jamais descerei do meu salto para fazer você gozar - embora eu saiba que só fato de você saber disso já te faça gozar.

    Você não passa de uma criança mimada. Uma criança chata que acha que sabe de tudo, mas que no fundo morre de medo que descubram que ela nunca se sentiu amada.

    Eu não tenho culpa, baby, se você foi o típico nerd que levou porrada, água na cara e bolinhas de papel na escada do colégio. Não tenho culpa se carregou nas costas a vida inteira o slogan “você é um bosta”. Não sou eu, não, mesmo, quem vai arrancar esse post it de suas lembranças.

    Espero que no próximo ano você viva uma vida real, tenha menos crises de depressão.

    Eu me dei alta de você. Faça o mesmo! Se dê alta de você e procure alguém real para amar porque só o amor que sentimos por alguém dá sentido e organiza a nossa existência. Apenas não se esqueça que “o amor, para ser amor, precisa se consumar”, como bem disse certa vez um homem lindo que carrega o amor até no nome, Jorge Amado.

    Tim tim.


    Joanna foi embora sem escutar o que o Artur tinha a dizer. Não importava mais o que ele dissesse. Ela só queria paz e isso ele jamais poderia lhe dar.


    NO VARAL


    Minha alma foi pendurada no varal
    enquanto minha calcinha escorria
    a rima de um beijo bom

    Eu não estava vestida de encontro
    quando o chão se fez urgente
    e me encontrou
    mas estava polvilhada de baunilha
    como um doce recém saído do forno
    a espera a primeira mordida

    Na rua ao lado, um assalto
    Na memória, um sino
    Na boca, rijos mamilos

    A madrugada engorda meus sentidos
    E faz o céu desabar num tom estranho
    um tom que não há

    Amanhece
    e estou desidratada como uma pêra
    exposta em demasia ao sol

    Amanhece
    E o que me resta é recolher minha alma
    e pendurar a calcinha no varal.


    CREME DE FRAGILIDADE


    E de repente ali estava eu: a cereja de um bolo chamado fragilidade. Eu sabia que não tinha mais idade para ficar chorando o dia todo, mas não resisti às primeiras horas e como uma criança que não sabe o que quer e soluça somente por desamparo, chorei.

    “Nenhuma boca souber me lamber como a sua, meu caro”.

    Era isso, exatamente isso o que eu queria dizer a ele antes que o avião cruzasse os ares. Mas talvez ele me achasse pretensiosa demais por me vestir de cereja, ainda que de um créme de fragilité.

    Outras bocas tentaram, mas elas tinham dentes demais! De mim queriam pedaços. Queriam me engolir! Queriam apenas o que em mim há de efêmero: o sabor. Gente gulosa! Gulosa e burra.

    Que prazer há em mastigar o que se deseja, santo Deus? Que cereja satisfará a gula dos olhos daqueles que não lêem perfumes?

    Você, não! Você tinha mãos de lavrador. Mãos que tocavam com cuidado terras desconhecidas e firmeza os nós que precisavam ser desatados . Tinha olhos de cão do mato, cão farejador.

    O creme de fragilidade que ampara a minha queda de fruta é apenas mais uma ilusão que você delicadamente me permite ter. você sabe que não há creme e que o destino de toda fruta é chegar ao chão quando madura.

    Você me permite esse engano e é por isso que eu te amo tanto!! Você não é vulgar!

    Além disso, você me lambe com seus lábios roliços, ergue minha saia e me põe em reboliço com sua cor de homem.

    E quando tudo acaba, em silêncio, a doçura dos seus olhos me faz compota…E adormecemos juntos, calda e fruto, certos de que nada importa mais do que a beleza daquilo que não podemos ser.



    BALADA DO SER ERRANTE



    Depois de um tempo você descobre que sua vida não passa de uma farsa
    Que tudo o que você fez ou faça
    É tão somente para ser bem visto e bem quisto pelos outros

    Descobre que sua necessidade de trabalhar 20h por dia
    Nada mais é do que um pretexto para se esquivar da própria agonia
    Da terrível e temível sensação
    De não ser aceito
    Não ser perfeito

    Descobre que até as roupas que USA
    São escolhidas por você como um passaporte
    Um cartão de ouro
    Capaz de abrir as portas do matadouro social

    Descobre que alguns amigos estão a seu lado
    Não por admiração ou carinho
    Mas porque você se esforça para ser especial
    E porque eles podem lucrar algo
    Nem que seja um telefonema no natal
    Um cartão postal de viagens invejadas

    Descobre que as pessoas não o conhecem
    E não tem a menor idéia de quem você seja
    Mas que no fundo elas não têm culpa disso
    Pois foi você quem sempre fingiu ser o que não era

    Depois de um tempo
    Você descobre que nada disso faz sentido
    Mas como está distante de tudo o que realmente é importante
    Já não consegue voltar atrás!
    Vive seus dias como um ser errante
    À espera de um “milagre”:
    Casamento, parceiro, dinheiro, emprego, filhos, felicidade

    E enquanto a cidade se agita
    Sozinho, no ninho
    Você grita
    E sente as dores de um parto que jamais aconteceu:
    O seu!!!


    outros textos no blog www.monicamontone-blog.com